O que mais gosto no universo do teatro é a amplitude que toca. Os palcos surpreendem-nos sempre e surgem em lugares inimagináveis. Personagens nascem em segundos, as vezes por necessidade, as vezes por que estava mesmo no roteiro e outras vezes por pura improvisação espontânea. Falo isso tudo para iniciar uma história de voluntariado que marcou a minha caminhada.

Aceitei o desafio de realizar um projeto num hospital!

A ideia era preparar alunos do secundário para intervenções alegres e descontraídas e interagir na ala pediátrica. Por intermédio da coordenação escolar e da assistência social hospitalar, o meu papel era escolher os alunos que participariam, prepará-los e executar o projeto na prática.

Ao contrário de um espetáculo, onde estou nos bastidores como diretora, eu estaria EM CENA com eles. E isso era fundamental. Não bastava apenas acompanhá-los. Deveria criar meu personagem e inspirá-los nas ações.

O voluntariado hospitalar é uma ação enriquecedora, inesquecível e, ao mesmo tempo delicada e muito, muito mais intensa. Trabalhar a inteligência emocional a cada minuto. Respirar resiliência e expirar afetividade.

A verdadeira solidariedade começa onde não se espera nada em troca”, como disse Antoine de Saint-Exupéry, autor do livro O Pequeno Príncipe. Levar adolescentes de encontro a uma realidade dessas… foi desafiante e transformador.

Preparei-me, com a ajuda de uma enfermeira e da coordenação, alunos do secundário. Criamos dois grupos de trabalho. Fazíamos revezamentos nesse projeto, cada grupo entrava uma vez por semana comigo no hospital.

A nossa interferência durava em torno de duas a três horas. Prosseguimos com este projeto por alguns anos. E a partir daí muitas histórias nasceram. Cenas rápidas, profundas e marcantes e tem uma delas que gostaria de registrar:

Já fazia algumas semanas das nossas entradas na pediatria. Como sempre, a montagem de todos começava no Colégio: calças coloridas, batas extravagantes, acessórios como chifres, marionetas e brinquedos infantis, também sapatos coloridos e maquilhagem com nariz de palhaço ou não, saíamos a pé para o hospital.

O Colégio ficava a cerca de 15 minutos de caminhada até o hospital.

E era a oportunidade de nos aquecermos: caminhávamos a cantar, a interagir com toda a gente na rua e isso nos enchia de energia para o voluntariado. Chegar lá, após os procedimentos de higienização… era respirar bem fundo e invadir.

Aquela alegria na recepção, nos elevadores ou escadas. O início era sempre através “porta”: nos entalávamos juntos, propositadamente é claro, passando uns por cima dos outros. A porta de cada quarto era um portal com muitas oportunidades.

À medida que a cena se passava à entrada do quarto, escutava-se risos do lado de dentro. Acompanhantes e crianças divertiam-se a ver. Era o momento da conquista e já conquistados… invadíamos o quarto. Mas sempre após a célebre pergunta: “podemos entrar?”

Normalmente o SIM surgia rapidamente. Mas não era sempre. Algumas vezes o NÃO ecoava e nós respeitávamos. Ficávamos sentados à porta, fingindo tristeza, a brincar, ou saímos e voltávamos mais tarde. Mas desistir jamais! A insistência quase sempre gerava acolhimento e alegria posteriormente. Mas, como já disse, as vezes não. E tudo bem, faz parte. A importância de respeitar e não impor é fundamental.  

E nossa história leva-nos a um determinado quarto, com a janela quase aberta, um silêncio incômodo e uma criança de uns quatro anos na cama, conectada a várias coisas.

Ela já estava lá há algumas semanas, e não podíamos aproximar-nos porque a mãe nos impedia, solicitava silêncio e sublinhou que a menina não reagia a nada. Naquele dia foi diferente, sentamo-nos à porta e cantamos uma canção de amor, tranquila e afetuosa. A mãe aproximou-se emocionada e agradeceu.

Comecei a conversar e explicou-me que a filha dela não reagia a nada já há alguns dias, mesmo de olhos abertos e entender tudo, ela já nem sequer sorria mais. Raramente falava e queixava-se de dor. A mãe estava na mesma sinergia. Num abraço apertado, implorei para permitir que interagíssemos… mesmo que por alguns instantes. Enfim, ela autorizou.

Olhei para os alunos, que já haviam percebido a complexidade e a necessidade de muita paz ali. Tirei do bolso uma marionete de mão: um coelhinho branco! Aproximei-me da cama, apresentei-me… e aqueles pequenos olhos fixaram-se no tal coelho. Manipulei a marioneta junto à cama a cantarolar e os alunos a verem, na mesma vibração.

Quando de repente escuto uma voz que diz: “o AU AU!” Silêncio completo!

E uma mãozinha trêmula aponta para o coelho e repete: “O AU AU!” E o coelho começou a latir, é claro! Um lindo sorriso iluminou aquele quarto acompanhado de uma risada discreta. A mãe começou a chorar e os alunos, emocionados, não sabiam se abraçavam a mãe ou se entravam na história do cão.

Em segundos, conectados pelo olhar, dividimos as tarefas: a mãe foi abraçada e muitos cães surgiram…

 … essa semana ainda eu conto o resto dessa história!

 

Abraços Demorados

Tanise, a Diva. 

😃🌻

Tanise A Diva

Tanise A Diva

Uma vida com a arte/teatro no Brasil e hoje vivendo com a família em Portugal. 🇧🇷❤🇵🇹 Insta: @tanise_diva

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