Já trabalhei em escolas que tiveram muitos problemas com telemóvel em sala de aula. Alunos a filmar os professores e colegas. A postar cenas e fotos constrangedoras. Muito cyberbullying, que não passa de agressão/assédio moral por meio das tecnologias digitais. Hoje já existem algumas leis que criminalizam esses atos. Mas é aquela história: internet é terra de ninguém. Quando cai lá, o estrago já está feito.

E o telemóvel tornou-se o espelho onde as pessoas “olham-se”, identificam-se, motivam-se ou vão pro fundo do poço.

É preciso muita resiliência para ter redes sociais. Por que é tudo conto de fadas: viagens maravilhosas, famílias perfeitas, relacionamentos fortes e perfeitos também, só gente, casas e lugares bonitos. Diferente da vida real, não é verdade?! 

Era uma turma do secundário. A exposição da foto de uma menina, partilhada sem a sua permissão, numa cena de festa, atraiu o interesse e todos os olhares da comunidade escolar. Não foi a primeira vez que isso aconteceu. Mas desta vez, era uma pessoa que todos diziam ser irrefutável, um exemplo de aluna, ativa positivamente em vários setores do colégio. “Ela revelou-se”, alguns diziam. “Ela não é do grupo de teatro?”, questionaram outros. E ela era, entre outras oficinas que participava.

E isso tornou-se o ápice da história. Até disseram que “por causa do teatro” ela ficou assim. Como se ela não pudesse sair do papel de aluna exemplar. Apesar de ela fazer parte de outras oficinas, apesar de ela estar a passar por uma fase pessoal difícil (e ninguém tinha nada a ver com isso), nada importava: ela fazia teatro.  

Decidi que ninguém entraria na minha sala com telemóvel. Conversei com a turma sobre e convidei-os à uma experiência: deixar o telemóvel numa caixa à entrada da sala e só pegariam ao término da aula. Mesmo surpreendidos, aceitaram a proposta, mas ressaltei que seria fácil de realizar. Parece uma coisa simples, não é? Mas não foi.

Eram dois tempos de aula seguidos, cerca de quase duas horas sem telemóvel. Na primeira semana, todos pediram pra ir ao banheiro em algum momento, na tentativa de somente olhar o aparelho na caixa. Incrível! Tive que fechar a caixa e deixar dentro da sala, num canto. Pensa em muitos olhares para o mesmo canto da sala, coincidentemente onde estava a tal caixa. A ansiedade era tanta que houve casos de suor excessivo, alguns relataram uma tremedeira nas mãos, outros que escutavam o som de entrada de mensagens e outras notificações. Ressalto que todos os aparelhos estavam desligados naquele momento. É a tal abstinência. A privação de algo que se deseja muito. Então, as aulas foram direcionadas a isso.

Realizamos dinâmicas de autoconhecimento pessoal e do grupo.

Quando estamos num grupo, percebemos que o outro vive batalhas semelhantes às suas. Compreende-se as razões de alguns comportamentos, ao conhecer o histórico pessoal, familiar, emocional dos colegas. A empatia cresceu. As amizades foram fortificadas e nasceram onde antes havia apenas silêncio.

Tem uma dinâmica que sempre resultou positivamente: faço uma divisão no chão e todos os alunos ficam de um lado. Faço perguntas e se a resposta for SIM, o aluno simplesmente vai para a outra divisão, o outro lado, sem falar nada, só vai. Sem justificar, nem comentar. Então, quando eu pergunto: quem se sente sozinho a maior parte do tempo? Quem não gosta do que vê quando se olha no espelho? Quem chorou essa semana, não importa o motivo? Quem tem insônia? E assim por diante. Quando olham um para o outro e percebem que não estão sozinhos naquela situação, algo muda instantaneamente. São mais simpáticos com os outros. E, gradualmente, o bullying não tem mais espaço. Defendem-se, apoiam-se mutuamente. Existimos na relação com o outro.

Um espetáculo só dá certo, quando o “jogo” acontece entre os atores. Quando um sabe que o outro está ali por ele. Quando há confiança e empatia e não competição. É uma eterna troca.

A turma evoluiu muito naquele ano e fui convidada a realizar a mesma experiência com outras turmas. Foi tudo perfeito? Claro que não. Mas os pontos positivos foram maiores, sem dúvida. E as transformações também. Aquela menina seguiu sua vida mais confiante e com o apoio e defesa de muitos colegas. Segundo ela, estava até mais leve, sem precisar carregar a armadura da aluna exemplar. E tudo isso… foi culpa do teatro!

É preciso parar de usar demasiado o telemóvel? Isso não vai acontecer.

O mundo só anda para a frente (mesmo que às vezes pareça que não). A tendência é tornar-se cada vez mais dependentes digitalmente. Por isso a importância da resiliência, da autoestima e do amor próprio.  

Abraços demorados

Tanise, a Diva. 

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Tanise A Diva

Tanise A Diva

Uma vida com a arte/teatro no Brasil e hoje vivendo com a família em Portugal. 🇧🇷❤🇵🇹 Insta: @tanise_diva

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