Ao olhar no espelho, gostas do que vê?

O teatro é um instrumento para melhorar da autoestima. Mas isso só acontece após um bom trabalho de autoconfiança e autoaceitação. Confiança para sustentar quem somos e aceitação de como somos. Portanto, a autoestima é um caminho que se cruza com outros caminhos, necessários para o enraizamento do amor próprio.

Ter coragem de falar em público (“Tens medo de falar em público?”), subir ao palco, permitir as expressões do seu corpo, de viver personagens (“A coragem da miúda!”) … são alguns dos pilares que sustentam a autoestima, dentro das artes cênicas.

Após uma atividade sobre elogio, que você pode ler no artigo “Elogiar é uma arte, receber também é!”, levei a turma do secundário até a sala de dança e posicionei-os em frente a um grande espelho. Pedi-lhes que apenas mirassem na sua própria imagem. Os olhares dispersavam-se e acabavam por olhar a imagem do colega. Fui insistente:

Olhem para a sua própria imagem! E os risos começaram.

Tive que dividir a turma em dois grupos. Um grupo sentado e de costas para o espelho, no lado oposto da sala. O outro em frente ao espelho. Com menos pessoas, o foco é mais fácil e os risos encerram-se.

Com o olhar fixo no espelho, em silêncio, estavam concentrados na respiração. Pedi-lhes que observassem o seu rosto: olhos, boca, nariz, orelhas, cabelos. Observassem o seu corpo na sua totalidade e também nos detalhes. No segundo momento, solicitei que cada um se autodescrevesse em voz alta, um de cada vez. Essa parte foi rápida, todos queriam passar a vez logo. Num terceiro momento, pedi que descrevessem o colega ao lado, um de cada vez. E aí vieram as surpresas.

Ninguém conseguia falar do colega sem dar qualidades. “Ele tem o sorriso que contagia”, “os cabelos dela tem um cheiro tão bom”, “tem um olhar que parece triste e faz-nos querer abraçar”, “a boca parece um coração perfeito”, “gosto muito da voz dele”, “ela tem o melhor abraço da turma” e assim por diante. 

Lágrimas começaram a escorrer nos rostinhos adolescentes que se surpreendiam com as descrições. Até que uma frase, quase um grito, foi ouvida mais alto no grupo: “Eu sei que não sou assim!”. Silêncio total…

Até os alunos que estavam sentados de costas, à espera da sua vez, viraram-se para ver quem era a interlocutora. E pasmem: era a rapariga que venceu como Rainha do Colégio, concurso que se realiza anualmente e os votos eram anônimos e de todo o colégio.

Ela não só era bonita, como todos referiam, também era ótima aluna com excelentes notas. Rose, como vou chamá-la nessa história, era uma aluna exemplar:  querida pelos colegas, professores e até pelos pais dos colegas. Líder de turma, sabia posicionar-se nas situações e era conhecida por sempre estar disponível para todos. Eis o porquê da surpresa geral.

Rose chorou. Em lágrimas disse que sabia que “não era assim”.

O colega descreveu-a como aquela pessoa que todos queriam como amiga e que ela era bonita por dentro e por fora. Naquele momento, percebi-me que Rose estava a sofrer. Ela seguiu em choro e disse que não tinha autoestima, que todos os dias lutava para ganhar atenção de todos, que não percebia essas coisas boas que sempre falavam dela.

Naquela turma, haviam alunos que a baixa autoestima era evidente e mesmo esses interferiram: “se não gostas de ti mesma, então eu nem sequer tenho hipótese nesse mundo!” e Rose começou a elogiar esses colegas como se os estivesse a defender num tribunal. Espantados e emocionados, os colegas começaram a aproximar-se e veio o abraço coletivo. (podes ler sobre a importância do abraço nos artigos “Corpo e a terapia do abraço” – Parte 1 e Parte final).

A autoestima é um assunto velado. Parece claro quem a tem e quem a não tem. Mas não é! Julgar as pessoas pela confiança e o sorriso aparente é um erro. Todo guerreiro tem as suas cicatrizes e muitas ainda parecem feridas abertas… basta um toque …para a dor se revelar.

Tocamos a Rose e aquele dia tornou -se um divisor de águas para ela e para turma.

Quer saber como termina essa história? Para teres uma ideia, o concurso da Rainha do Colégio nunca mais aconteceu… Rose conseguiu mudar isso… 

No próximo artigo, conto-lhes o resto.

 

Abraços demorados.

Tanise, a Diva. 

😃🌻

Tanise A Diva

Tanise A Diva

Uma vida com a arte/teatro no Brasil e hoje vivendo com a família em Portugal. 🇧🇷❤🇵🇹 Insta: @tanise_diva

One Comment

  • Avatar Ariadne disse:

    todos os dias lutava para ganhar atenção de todos, que não percebia essas coisas boas que sempre falavam dela.

    Este trecho mostra tanto… Vivemos um momento de superexposição, e as crianças e adolescentes estão constantemente no esforço para serem aceitos, bem quistos, populares … Ninguém pode ser feliz com essa pressão toda… Espero que Rose se encontre e seja firme para não se curvar às expectativas alheias

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